quarta-feira, 30 de julho de 2008




O Estado do Rio de Janeiro tem enfrentado o drama de enterrar anualmente 8.000 pessoas vítimas de homicídio. Se somarmos a essa estatística o número de cidadãos fluminenses assassinados, mas que constam na lista de desaparecidos (4.633 no ano passado), essa cifra pode chegar a mais de dez mil homicídios. Policiais e pesquisadores no campo da segurança pública têm afirmado que, provavelmente, cerca de 70% dos casos de desaparecimento resultam de assassinatos. Isso significa que até o final do ano pelo menos 4.000 seres humanos terão a vida ceifada de uma forma ou de outra no estado do Rio de Janeiro. Sim, gente que nesse momento está viva não estará mais entre nós dentro de poucos meses, dias ou horas. Famílias inteiras estão prestes a iniciar uma nova fase da sua história - a luta contra a depressão em razão da saudade do parente assassinado.
Uma sociedade que tem um prognóstico de morte certo como esse, em razão da eficiência histórica do crime em sua vida, não pode deixar de pensar em um plano de salvação imediata para os que caminham a passos largos para o fim brutal de suas vidas. Falar apenas em termos de soluções de médio e longo prazo num cenário como esse significa afirmar que milhares vão morrer – entre os quais possivelmente você e eu, ou um dos nossos filhos – e tudo o que podemos fazer é sujeitar-nos em silêncio ao poder da barbárie. É sofrer derrota da pior espécie: a derrota de quem perdeu por haver se recusado a lutar. Num cenário como esse, o que não podemos é “decidir não decidir”, permitir que a maldade do perversos seja reforçada pela fraqueza dos virtuosos, tornando-nos desse modo cúmplices de um massacre de vidas humanas. Em suma, há uma justificativa moral para que algo seja feito imediatamente.
Os relatórios da ONU, da Anistia Internacional e do IBGE divulgados recentemente, os números do Instituto de Segurança Pública, a expansão das milícias, a corrupção das polícias, o poder bélico do tráfico e os fortes interesses corporativistas daqueles que não querem pagar o preço da paz, são todos sinais de que o Rio de Janeiro tornou-se ingovernável no campo da segurança pública. A maior necessidade de quem governa um estado como o nosso é humildade para admitir o fato de que é impossível dar um fim aos crimes que nos envergonham sem o apoio da população, do governo federal e das forças armadas. A experiência do exército brasileiro no Haiti prova que podemos garantir um mínimo de ordem para que o Estado possa levar políticas públicas a áreas pobres, com tempo para reestruturar as polícias e preservar milhares de vidas. Não é uma situação ideal, mas menos ideal ainda é o quadro de cidadãos desse Estado tendo que viver em território ocupado por bandidos. Homens e mulheres, na sua maioria esmagadora pobres, privados do direito de livre expressão, do direito de ir e vir e do direito à vida! E ainda tendo que pagar imposto para o Estado e para marginais.
A população não pode esperar a tragédia alcançar a sua família para aprender a ser gente. Chegou a hora de eliminarmos as nossas diferenças unindo-nos em torno de um objetivo que é comum aos seres humanos em geral: o respeito ao direito à vida! É tempo de não permitirmos que o mal triunfe mediante a inatividade dos bons. Precisamos compreender que correr o risco de lutar por uma causa e fracassar é preferível à vergonha de ter que admitir para filhos e netos que fomos covardes. Sim, é momento de agirmos. Não um mero espasmo ou catarse coletiva após uma morte que nos causou comoção social, mas uma açãoo firme e contínua, de um povo capaz de usar as armas da razão e da lei, que só tem a temer o deixar o Rio de Janeiro entregue aos perversos.
Que o povo e o governo se unam para o resgate da plena experiência democrática: liberdade com justiça. Que haja humildade por parte dos nossos governantes (para rever caminhos e admitir limitações) e envolvimento por parte da população (por saber que a salvação está em suas próprias mãos) .

Antônio Carlos Costa - Presidente do Rio de Paz

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