domingo, 2 de agosto de 2009

Crack,nem pensar - Heróis da resistência

Um é coronel, um é ex-usuário de drogas e o outro, padre. Em comum eles têm a vida dedicada a devolver o caminho a quem perdeu o rumo. Praticamente anônimos, trabalham com paciência, fé e dificuldade de recursos financeiros. São os guardiões da esperança, pessoas responsáveis por clínicas de tratamento e sinônimos de ajuda quando o desespero atinge as famílias.

O choro e os gritos de três meninos de rua numa delegacia de Itajaí, há 38 anos, despertaram o início da mobilização contra a dependência química e pela prevenção às drogas para o então capitão da Polícia Militar e hoje coronel da reserva, Valmor Raimundo Chaves, 71 anos.

Ele é um dos pioneiros na recuperação de dependentes na Grande Florianópolis com as comunidades terapêuticas do Centro de Valorização Humana, Moral e Social (Cevahumos), em Angelina. Também está à frente de um projeto de ocupação com 120 crianças de seis a 14 anos, no Bairro Abraão, região continental da Capital.

“Cabeça”, “Satanás” e “Berruguinha” consumiam drogas, viviam sujos e furtavam. Na delegacia, ao perceber que os três tinham apanhado, Chaves decidiu levá-los para o quartel da PM, onde ganharam ocupação e saíram das drogas.

O coronel está convicto que a ofensiva contra o vício deve ser na prevenção, na educação e na ocupação das crianças antes que elas experimentem maconha, cocaína e crack, a droga responsável por 90% das internações nas três comunidades terapêuticas do Cevahumos.

Dificulade financeira é comum entre os trabalhos

Num dos espaços, no Bairro Abraão, as crianças ganham alimentação e participam de oficinas de educação física, dança, artes e capoeira. A sala de informática e o consultório odontológico estão praticamente montados, mas estão vazios porque o Cevahumos não dispõe de recursos para pagar profissionais.

– Temos convênio com a prefeitura, mas não são suficientes para pagar um dentista ou os professores de informática – lamenta Chaves, que estima a necessidade de uma ajuda de R$ 2 mil mensais para viabilizar as oficinas ás crianças.

A dificuldade financeira também é problema comum entre estes três homens – empecilho que eles igualmente conseguem superar. Cansado de perder amigos presos ou mortos pelo envolvimento com drogas, o ex-dependente químico Jonas Ricardo Pires, 44 anos, da Capital, dedica-se à mesma causa do coronel Valmor. Ele fundou a primeira fazenda de recuperação do Centro de Recuperação de Toxicômanos e Alcoólicos (Creta) em 1995, em Palhoça. Hoje, 14 anos depois, são 14 fazendas em São José, Florianópolis, Palhoça e Paulo Lopes, e 490 dependentes em recuperação – 70% deles com problemas com o crack.

Livre das drogas, Jonas casou e hoje é tratado com um salvador por centenas de ex-usuários. Ele quer ampliar o projeto e calcula a necessidade de mais 60 novas vagas – o problema é a dificuldade financeira comum a essas entidades.

O padre Luiz Prim, 50 anos, ainda reza missas, celebra batizados, mas a razão maior de seu conhecimento e trabalho espiritual está ligada a cinco clínicas de tratamento da Grande Florianópolis. Iniciou na atividade há mais de duas décadas quando participava de movimentos populares. Um dos lugares que atua é o Recanto Silvestre, em Biguaçu – o espaço foi doado por um empresário que perdeu o filho viciado em heroína e que morreu de overdose.

Mais de mil pessoas em tratamento já passaram pelo trabalho de libertação do padre. O jeito brincalhão de falar e o modo de vestir-se, com calça jeans e camisa para fora, nada o associam a um religioso.

– Quem usou crack aqui? – pergunta ele a um grupo de 20 ex-usuários em tratamento, enquanto a maioria levanta o braço.

– Você tem cara que fumava casca de ostra achando que era pedra de crack – brinca com um deles, seguido de gargalhadas dos internos.

Com alegria e otimismo é que o padre de Florianópolis abastece o olhar machucado de quem quer abandonar a maconha, a cocaína, o álcool e, principalmente, o crack – a droga mais pesada e que esgota as vagas nas clínicas de Santa Catarina.

diogo.vargas@diario.com.br

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fonte:Diário Catarinense

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